A
SERRA E O AGUÃO
Depois da seca de 1939,
Na década de 1940 aconteceu em Conquista um fato
singular,
A Serra do Piripiri e o Aguão se apaixonaram com ardor,
Que paixão mais linda!
A natureza parou
para vê-los se amar,
O sonho pouco durou!
A defesa
sanitária acabou com o Aguão! E o sonho findou...
(1) A Serra do Piripiri:
- Sou Piripiri cá
de cima e, digo para o Aguão lá embaixo,
Não
fique tão triste assim! Que eu mando a nuvem chover,
Quando
ela passar cá em cima eu faço dela um riacho,
A
chuva vai cair em gotinhas e, pelo meu lombo escorrer.
(1) O Aguão:
- Sou o Aguão cá de
baixo e respondo pra serra lá em cima,
Proceda
assim minha amada, me mande as águas pra baixo,
Mande
com cuidado e zelo, pois o poder público é sovina,
Não
faz as obras necessárias e os pobres vão sofrer cá embaixo.
(2) A Serra do Piripiri:
- Não se preocupe
meu amor, vou cuidar disso com atenção,
Não
mando chover de uma vez, pois vai fazer estragos na cidade,
Conquista
é ainda pequena e o calçamento sofrerá com a erosão,
Outubro
sendo o mês das chuvas, ainda vai chover de verdade.
(2) O Aguão:
- Oh! Serra formosa
bonita e bela, a ti, um pedido vou fazer,
Sou
solteiro e vivo sozinho, é meu sonho contigo me casar,
Desejo
as núpcias com a serra, para juntos poder sempre viver,
Mande-me
a resposta por carta, ou mande o trovão respostar.
(3) A Serra do Piripiri:
- Hoje é o meu dia
de sorte, te vejo lá embaixo com paixão,
Vou
semear sempre-vivas, e as flores te mandar em buquê,
Daqui
de cima sempre esperei, que fizesses esta declaração,
Aguardo
as águas chegarem, descerei e, te darei meu coração,
Quando
as chuvas chegarem, pelo Verruga eu vou responder.
(3) O Aguão:
- A
paixão de mim tomou conta, sonho antigo que magoa e fere,
As
cartas traduzem nossos sonhos, contendo todo nosso amor,
Mande
logo uma carta pra mim, antes que eu me desespere,
Se o
trovão vos faltar, use o riacho Verruga como teu portador.
(4) A Serra do Piripiri:
- Aguão te avisto
lá na baixa, cá de cima a visão é de enlouquecer!
Vejo-te
de qualquer ponto, lá resplandeces em beleza de espelhos,
No
vosso corpo fica parte de mim, é a parte que eu mando pra te ver,
Padrinhos,
o Marçal, e a Tromba! E a Caatinga para nos dar conselhos.
(4) O Aguão:
- Tenho notícias
tristes pra te dar, o poder público vai comigo acabar,
Serra
que eu amo, em silêncio despeço-me de ti, a dor chega a pungir
Em
conversa nas beiradas de mim, o João Ferreira veio me avisar,
Estou
chorando de dor e tristeza, pois nunca mais vou poder sorrir.
(5) A Serra do Piripiri:
- Não desespere meu
amor! Por dentro de ti continuarei a
passar,
Que
tristeza me dá, nunca mais ver daqui de cima a tua imagem,
Se
destruírem a tua barragem, continuarei as vossas terras molhar,
Estou
presa aqui eu bem sei, não posso te acompanhar na viagem...
(5) O Aguão:
- Rio abaixo vou-me
embora, me despeço da Serra e da chuva chorando,
Os
homens vão quebrar a barragem, não sabem o mal que me fazem!
Amor,
esperanças perdidas, sonhos desfeitos, e nós inda nos amando,
As
águas já vão embora! Saudades da Serra que eu tanto quero bem!
(6) A Serra do Piripiri:
- Vou morrer de
tristeza cá em cima, sem você a vida não tem sentido,
Já
começam a corroer o meu lombo, pelo cascalho a pedra e as areias,
Destino
cruel, vão acabar comigo, nada poderei fazer sem um marido,
As
águas que de ti se escoam, são as águas que correm em minhas veias.
(6) O Aguão:
- Sabendo que estou
perto de morrer, eis a minha última recomendação:
Mande
sempre as tuas lágrimas molhar as terras que me viram nascer,
Nunca
mais vou ver a Serra do Piripiri! Estraçalharam o meu coração,
Minha
alma se escoa pelo riacho do Poço Escuro, por ali vou me escorrer.
Desfecho:
As
águas que descem da Serra do Piripiri passam sempre pelo leito do
Aguão,
em desabalada carreira e nunca mais o velho Aguão teve a sorte
de renascer, a
antiguíssima Serra do Piripiri embora ferida pela insanidade do homem,
permanece de luto até hoje e nunca mais teve outro amante a ocupar o lugar do
Aguão,
Sonhos
desfeitos pela mão dos que se beneficiaram das águas do Aguão
Sonhos desfeitos
pela mão dos que mutilam até hoje a velha Serra do Piripiri.
Ato final:
Fecham-se as
cortinas lentamente! Ouve-se um choro pungente de um menino que passou toda sua
infância brincando, tomando banho e pescando no velho Aguão!
Donde avistava ao
longe a bela, majestosa e velha Serra do Piripiri.
Utopia de uma
paixão sem fim entre dois “seres” que fizeram parte da minha infância. Saudades
imorredouras dos meus tempos de criança, Saudades sem fim...
Vitória
da Conquista, Ba. - 15 de dezembro de 2006
Edimilson
Santos Silva Movér
A SERRA E O AGUÃO - POESIA (63)